No RN, 83% dos agentes mortos são policiais militares fora de serviço
Em cinco anos, os policiais militares mortos que estavam fora de serviço, da ativa ou da reserva, representaram 83% das mortes de agentes da segurança pública do Rio Grande do Norte. Ao todo, foram 63 vítimas entre 2017 e 2021, de um total de 76 óbitos. Quando se compara os dados com agentes em serviço, a diferença é considerável: apenas três morreram em 5 anos. Os dados são da Coordenadoria de Informações Estatísticas e Análise Criminal do RN (Coine/Sesed) enviados à pedido da TRIBUNA DO NORTE.
O alto índice vem apresentando redução nos últimos anos em relação aos PMs da ativa fora de serviço. Em 2017 e 2018, foram 28 casos, contra 10 em 2019, 2020 e 2021, totalizando 38 nos últimos cinco anos. Em 2022, nenhum PM morreu atuando fora do serviço, isto é, sem o uso da farda. Na avaliação do Coronel Zacarias Mendonça, subcomandante da PMRN, um dos fatores que pode explicar a redução de mortes de agentes da ativa é o incentivo de pagamento de diárias operacionais.
“Antes, o PM visava complementar seu orçamento com outros tipos de serviço. Com o advento de nós termos uma rotina de D.Os, muitos deixaram de tirar bicos para trabalhar na PM. Uma coisa é você estar fardado numa viatura, equipado e com gente para te dar proteção. Outra é você estar exposto, que traz um risco”, aponta. Atualmente, o valor da diária está em R$ 107,40 para seis horas.
De acordo com os dados da Coine, vinculada à Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social (Sesed), de 2017 a 2021, entre os policiais da reserva, 25 PMs aposentados morreram nesse período, de um total de 76 óbitos entre todos os agentes da segurança pública. Também constam na lista policiais civis (da ativa e aposentados), guardas municipais, policiais penais, policiais federais e bombeiros militares.
“Uma das hipóteses de explicação para isto é que somos o maior efetivo, estamos em todos os estados e municípios, atuamos no confronto direto e isso evidencia uma maior exposição às ações criminosas. Então, com o aumento das ações de violência e a resposta dos policiais em suas atuações, esse profissional é caçado estando ele de serviço ou de folga”, aponta a presidente da Associação dos Subtenentes e Sargentos Policiais Militares e Bombeiros Militares do RN (ASSPMBMRN), subtenente Márcia Carvalho.
O secretário de segurança do Rio Grande do Norte, Coronel Francisco Araújo, diz que as instituições de segurança não possuem um “controle” sobre os agentes da reserva. “Ele não tem um vínculo direto de se saber onde está, o que está fazendo. Quando é algo que acontece com ele, é que a instituição avalia o que vai fazer, se é inquérito ou algo ligado à polícia”, diz.
O Coronel Francisco Araújo também acredita que a redução de mortes de PMs da ativa pode estar associada a reajustes salariais e planos de carreira formatados pelo Executivo, além das diárias operacionais.
“Um dos fatores é que, quando há incremento no salário para ativos e inativos, essa melhoria evita que esse policial procure esses trabalhos. Quando ele tem um salário e vai complementar com outra atividade, se ele tem remuneração melhor, tem possibilidade menor de fazer esse sacrifício”, avalia.
Nesta semana, chamou a atenção a execução de dois policiais militares da reserva na zona Norte de Natal. Os agentes foram alvejados com tiros de espingarda no bairro Potengi. Ambos tinham condenações por crimes de homicídio e estavam expulsos ou afastados da corporação. O sargento reformado, Antônio Carlos Ferreira de Lima, foi condenado a 14 anos de prisão por intermediar a morte do advogado Antônio Carlos de Souza Oliveira. Já o soldado PM, Márcio André, esteve preso por força de um mandado de prisão em flagrante, em 2013, acusado de estar envolvido em um grupo de extermínio, durante a Operação Nêmesis, deflagrada pela Polícia Civil.
Quando se observa os números de outros agentes de segurança pública do Rio Grande do Norte mortos em serviço, o quantitativo é consideravelmente menor. Entre 2017 e 2021, foram três casos, sendo um guarda municipal, um policial militar e um policial civil, em 2017 e 2018, com os outros anos não registrando casos.
Mortes por policiais em confronto aumentam
As mortes em decorrência de confrontos policiais apresentaram aumento de 5% no Rio Grande do Norte, segundo dados da Coordenadoria de Informações Estatísticas e Análise Criminal do RN (Coine/Sesed) obtidos pela TRIBUNA DO NORTE via Lei de Acesso à Informação (LAI). Os policiais militares são responsáveis por 98% da taxa de letalidade, com 148 mortes em 2021.
De acordo com os dados da Coine, vinculada à Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social (Sesed), de 2017 a 2021, foram 781 mortes registradas entre forças de segurança como Polícia Militar, Civil, Força Nacional e Polícia Rodoviária Federal. A PMRN lidera o ranking, com 728 mortes (93% do total), seguida da Polícia Civil, com 37. Em 2022, até o dia 27 de abril, foram 33 óbitos contra 53 no mesmo período do ano passado, redução de 40%.
Para o subcomandante da Polícia Militar do Rio Grande do Norte, Coronel Zacarias Mendonça, a PM está à frente do ranking por ser uma força de segurança de característica ostensiva e que na maioria dos casos, possui o primeiro “contato” com a criminalidade.
“Quem faz o policiamento ostensivo é a PM. Além de sermos a maior instituição do sistema, é a única que está em todos os locais do RN e a que tem, na sua finalidade, o policiamento ostensivo, preventivo e redutivo. Devido a isso, acontecem os confrontos. Temos chamadas na RMN de 6 mil ocorrências por dia. Dessas, 40% são acionamentos para a PM. Se tem uma demanda em que se defronta com ações, e obviamente que vai ser maior as ocorrências com confronto do que a Polícia Civil, uma instituição judiciária”, diz.
Ainda de acordo com o Coronel Zacarias Mendonça, nos últimos anos houve mudança no perfil da criminalidade. “Antes, tínhamos confrontos com infratores, mas eram isolados, os bandidos não reagiam. Com o advento das facções, com cada bandido fazendo parte de uma e adquirindo força bélica, eles começaram a reagir os policiais. Na maioria das ações, há confronto, porque o bandido está mais violento e tem um amparo da facção, que lhe dá armamento e sustento”, acrescenta.
Na Polícia Militar, por exemplo, em caso de confrontos, tendo óbitos ou não, são abertas sindicâncias ou inquéritos policiais militares para apurar a conduta dos agentes envolvidos na ação, a depender da atuação. Os PMs são afastados para o serviço administrativo e a depender do que é apurado, voltam ou não ao serviço ostensivo. As sindicâncias têm prazo de 30 dias, prorrogáveis por mais 15. Na PMRN, em 2022, foram 52 inquéritos policiais militares instaurados e nenhum concluído e 29 sindicâncias. Em 2021, foram 97 IPMs, sendo 9 em processo de instrução, 53 em análise e 35 concluídos e 81 sindicâncias, sendo 13 em instrução, 14 em análise e 54 concluídos.
“Todo confronto em que há troca de tiros, há inquérito aberto. O certo seria eles serem afastados, por uma semana, terem acompanhamento, mas nosso corpo de assistência social e assistência médica é pequeno, com demanda maior que a oferta. No geral, a gente apura e vê as causas e dentro do que apurar, ver se tiver algum ilícito, ele será indiciado. Se não, é arquivado”, acrescenta Mendonça.
As apurações internas também são feitas quando é necessário apurar outras situações, como casos de policiais que se utilizam da farda para cometimento de irregularidades ou abuso de poder, por exemplo, e para agentes que, fora do horário de serviço, utilizam-se da profissão de agente de segurança pública.
“A PM dá para o cidadão todo o conhecimento técnico e profissional, mas a índole, virtudes, defeitos e vícios estão aqui dentro. Somos frutos da sociedade”, aponta Mendonça.
No Rio Grande do Norte, dois casos recentes chamaram a atenção sobre violência policial com agentes utilizando-se da farda. Em junho de 2020, quatro policiais, utilizando de uma viatura e da farda, sequestraram e executaram o jovem Giovanni Gabriel de Souza, 18 anos. As investigações da Polícia Civil mostraram que os agentes buscavam um suspeito de roubar carros na região de Goianinha quando se depararam com Gabriel. Os PMs chegaram a ser indiciados pelo MPRN por homicídio e estão aguardando em liberdade.
Em outubro de 2021, outro caso. O Comando Geral da PM puniu de forma disciplinar um sargento por três dias por lesão corporal. Na ocasião, o sargento que estava de folga, se deparou com um indivíduo praticando assaltos, com isso, deteve o homem e o levou preso.
Na audiência de custódia, por sua vez, o criminoso alegou que foi agredido fisicamente pelo policial, fato que ficou atestado no exame de corpo de delito. O sargento foi detido por 3 dias como punição pela transgressão.
A PMRN informou ainda que, atualmente, há pelo menos 19 policiais militares presos em decorrência de condutas irregulares no exercício da profissão. O órgão pretende inaugurar, até o fim do ano, um centro de ressocialização de agentes, onde funcionava o CDP Potengi, na Zona Norte. Os custos serão de R$ 800 mil, recursos do TJRN.
Policiais terão câmeras nos uniformes
A Secretaria de Estado da Segurança e Defesa Social do RN (Sesed-RN) deve assinar, nesta semana, o contrato para aquisição de câmeras para policiais militares, projeto-piloto da pasta que tem expectativa de ser colocado em prática no segundo semestre de 2022. Serão 15 câmeras utilizadas, inicialmente por três anos, nos policiais da Rondas Ostensivas com Apoio de Motocicletas (Rocam).
“Estamos em fase final, próxima semana a empresa vai apresentar certidões e vamos assinar o contrato. O início da operação deverá ser no início do segundo semestre”, explica o tenente coronel Leonardo de Araújo, coordenador de projetos e convênios da Sesed. O Estado também está tentando captar outras 55 câmeras via Ministério dos Direitos Humanos para ações na Patrulha Maria da Penha.
Ao todo, a iniciativa foi orçada em R$ 500 mil e é viabilizada por uma emenda parlamentar federal do senador Styvenson Valentim (Podemos). Neste projeto-teste, as câmeras serão acopladas nos uniformes dos militares da Rocam do RN.
O titular da Sesed, Coronel Araújo, diz que a ideia do projeto é garantir segurança para a população e policiais. “É uma tecnologia de ponta, que custa caro e que vai ajudar nas ações tanto para o cidadão, na transparência, quanto para o próprio PM”, diz.
As câmeras corporais serão acopladas à farda dos agentes e podem fazer registros em áudio e vídeo, além de transmissões ao vivo e fornecer localização em tempo real. Esse tipo de câmera também permite o monitoramento remoto e o armazenamento do conteúdo em nuvem. Os dispositivos são capazes de gravar de forma automática e ininterrupta.
Para a presidente da Associação dos Subtenentes e Sargentos Policiais Militares e Bombeiros Militares do RN (ASSPMBMRN), a subtenente Márcia Carvalho, diz que o uso das câmeras é “interessante até mesmo em uma situação em que o policial é denunciado, e não tem como comprovar sua abordagem”.
Em cinco anos, os policiais militares mortos que estavam fora de serviço, da ativa ou da reserva, representaram 83% das mortes de agentes da segurança pública do Rio Grande do Norte. Ao todo, foram 63 vítimas entre 2017 e 2021, de um total de 76 óbitos. Quando se compara os dados com agentes em serviço, a diferença é considerável: apenas três morreram em 5 anos. Os dados são da Coordenadoria de Informações Estatísticas e Análise Criminal do RN (Coine/Sesed) enviados à pedido da TRIBUNA DO NORTE.
Ícaro Carvalho – Repórter – Tribuna da Norte
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